22 out O olhar da semiótica para a publicidade de causa nas relações de consumo
Em artigo publicado na e-Compós, Clotilde Perez e Bruno Pompeu, sócios-fundadores da Casa Semio, juntos a Lucia Santaella, discutem o que ficou conhecido como publicidade de causa. À luz da teoria semiótica, os autores buscam entender as potencialidades e os limites dessa forma de manifestação mercadológica.
O artigo tem início nas indissociáveis relações entre a sociedade contemporânea e o consumo, que entrelaça hoje todas as relações sociais e políticas. De forma que “pensar a sociedade contemporânea implica pensar o consumo – e vice-versa”. Do marketing social, passando pelo marketing societal, chega-se hoje ao que ficou conhecido como marketing de causa, que, ao dar derivação à publicidade de causa, compreende toda ação mercadológica que, “com objetivos mais ou menos evidentes, expressa o posicionamento da empresa ou marca em relação a alguma causa social”.
Duas teorias de C. S. Peirce sustentam a discussão. A primeira é a teoria da causalidade. Os autores explicam que Peirce acreditava que as leis da natureza deveriam ser probabilísticas em vez de determinísticas, como era enxergado a relação de causa até o momento. Assim, partindo de suas três categorias fenomenológicas, o autor chega na relação: acaso – imprevisível, não determinado –, causação eficiente – ação concreta, no aqui e agora – e causação final – o propósito. A partir disso, a publicidade de causa pode ser categorizada a partir de seu conteúdo: como simplesmente falando de causas, apontando para fora (acaso), abordando as ações concretas e cotidianas tomadas pela empresa (causação eficiente), ou procurando gerar uma mudança de pensamento no consumidor, com propósito coletivo (causação final).
A teoria dos interpretantes constitui o segundo fundamento do artigo. Isso porque, segundo os autores, “cabe pensar sobre a natureza das causas das marcas a partir do entendimento de suas possibilidades interpretativas, seus efeitos, como forma de prever as possíveis relações com seus públicos”. Essas possibilidades interpretativas podem assumir um caráter emocional, energético, isto é, envolver um esforço físico ou mental, ou lógico, os hábitos interpretativos.
Surgem, então, três possibilidades de categorização da publicidade de causa a partir de seus potenciais efeitos de sentido – possibilidades não excludentes, mas interrelacionadas, dada a própria natureza semiótica. As campanhas de sensibilização exploram aspectos que afetam a capacidade de sentir do receptor, com um efeito emocional proeminente. As campanhas de engajamento convidam o público a agir, realizar uma ação frente ao problema apresentado pela causa. Por fim, há as campanhas que buscam a transformação da consciência, ao apresentarem novos conceitos, novas concepções e novos entendimentos da sociedade.
Nesse percurso teórico, há um esforço reflexivo dos autores para compreender os limites dessas modalidades de publicidade de causa frente ao sistema em que elas estão inseridas, permeado pelos interesses efetivos das empresas anunciantes. Surge, assim, o questionamento: “em que medida pode ser interesse de uma empresa (dona de uma marca, anunciante) que efetivamente se alterem os entendimentos e os princípios que sustentam a sociedade do jeito que está?”. Uma questão complexa, com resposta pouco simples, mas desenvolvida no decorrer do artigo com o aporte da semiótica colaborando nesse entendimento.
Apesar de “improvável, difícil e desafiador” tomar a publicidade como condutora do propósito de transformação da sociedade, ela cumpre uma função primeira de sensibilizar para as questões sociais e uma função segunda de promover engajamento para ações concretas das marcas, “e isso, de fato, já é muito”.
O artigo “PUBLICIDADE DE CAUSA NAS RELAÇÕES DE CONSUMO: os vínculos de sentido entre acaso, causação eficiente e propósito em campanhas publicitárias” na íntegra pode ser acessado no site da Compós.